Nas grandes cidades Brasileiras as classes média e alta estão aprendendo a viver em guetos. E isso não é de hoje, já faz mais de trinta anos que estão neste processo. Aqui em Belo Horizonte esta realidade é facilmente percebida na ausência desses cidadãos no espaço público. Gradativamente e sem perceber perderam o direito ao espaço público e não desconfiam que foram roubados de um direito básico. Pulam de gueto em gueto, do colégio ou trabalho para o condomínio, do condomínio para o shopping e do shopping para o clube.
A população pobre cada dia é encurralada no gueto do seu bairro, onde sair à noite é perigoso, ficar na rua é sinônimo de vadiagem e para a polícia, motivo de abordagens agressivas. No centro os moradores de rua, são constantemente roubados pelo famigerado “caminhão branco” da Prefeitura Municipal que leva os seus pertences para inviabilizar a vida nas ruas. Artesãos Nômades tem seus materiais de trabalho apreendidos em ações baseadas em um Código de Postura Municipal que fere direitos Constitucionais.
Para a Administração Municipal gente na rua é sinônimo de problema ou de lucro. Se for um pequeno grupo, espontâneo ou organizado, que se reúne em algum espaço público, logo é motivo de marginalização e acompanhamento de perto pela Fiscalização Municipal. Se for um grande evento, com patrocinadores e visibilidade na mídia, a coisa muda e passa a ser reverenciado pela Administração Municipal. A ideia é clara, gente na rua tem que render lucro, ou é sinal de problema.
Gradativamente toda a população vai perdendo o seu direito de ir e vir, de curtir a cidade, de se encontrar na esquina ou na praça do bairro, de conversar, de brincar na rua. Para isso há uma justificativa perfeita: a violência. A violência está em todos os lugares, principalmente nas ruas, sendo assim, melhor que não tenha nenhum cidadão nas ruas. Caso haja, deve ser abordado, identificado e de preferência orientado a ir para a casa. Ainda não perceberam que gente na rua é sinal de segurança, um cuida do outro, e quando tem gente vendo fica mais difícil para a violência acontecer. Aliás, é seguindo esta lógica que se instalam câmeras nas ruas, saem às pessoas e entram as câmeras.
Esquecem os administradores municipais que é da natureza do homem se levantar quando é tolhido de seus direitos. Estamos de pé! Prontos para reivindicar o que é um direito nosso. Queremos as ruas de volta. Queremos o direito de poder nos encontrar em nossas praças abandonadas. Queremos o direito de desligar a televisão e ir jogar bola na hora da novela. Queremos poder tocar violão na praça e encontrar os amigos sem precisar ir para um espaço privado.
Blocos de carnaval independentes, que não têm patrocinadores ou políticos em suas organizações, são considerados um problema. Grandes blocos com patrocinadores ou políticos organizando tem, além de financiamento, toda a publicidade da Prefeitura a disposição. Esta diferença mostra o quanto a administração municipal se encontra distante da população.
Não queremos grandes blocos, não queremos cercas, nem regras absurdas para sair às ruas. Queremos de volta a nossa liberdade, o nosso direito de folia sem repressão e sem criminalização. O povo nas ruas é sinal de festa, de alegria e de revolução. Se não entendem que não queremos viver em guetos, que cercas, alarmes e câmeras são apenas motivos de opressão e não resolvem o problema da violência, demonstraremos nas ruas.
Nossa alegria é contagiante, nossa disposição é de quem tem samba no pé e fogo no corpo. Não, Sr. Prefeito, não aceitamos a sua cooptação de nossa festa. O Carnaval de Rua é do povo e não da Belotur. Suas estratégias de controle e opressão nos mostra que estamos no caminho certo. Queremos nossas ruas cheias de gente, brincando, se divertindo e celebrando a vida. Porque sabemos que só no encontro das ruas, só quando estamos diante do outro, do diferente, é que podemos crescer e aprender a ser cidadão. No gueto, Sr. Prefeito, aprende-se o medo, a angustia e a depressão, tão comuns neste povo que está sendo enjaulado em casas, escolas, shoppings e condomínios fechados.
Abram alas, o Carnaval de Rua vai tomar a cidade, vai contaminar a sua alma e quando estiver desanimado, solte corpo, entre na dança, porque quem fica parado vai acabar aprisionado.
Em tempo: A lei geral da FIFA, que também será aplicada em nossa capital, prevê que para as festas de rua só poderemos nos encontrar nas Fan Fest, espaços cercados e com segurança particular. Já foram montadas arenas desse tipo na Praça da Estação e na Praça JK. Um teste para a Copa, onde todos os bares deverão ser fechados em dias de jogos e só poderemos nos reunir nestes espaços cercados.