Acredito no estado eterno de mudanças.

Gosto de ver as mudanças da vida. Ontem criança, hoje adulto, amanhã idoso. Este espaço é para provocar diálogos que possam ajudar a mudar o meu jeito de olhar. E quem sabe você também entra nessa? Seja bem vindo, comente, critique, o anonimato aqui é bem vindo.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Um mar de Laranjas invade BH!

“A revolução não vai passar na tv, é verdade
Sou a favor da melô do camelô, ambulante
Mas 100% antianúncio alienante
Corro e lanço um vírus no ar
Sua propaganda não vai me enganar...”  
Para ler escutando:



Manhã de sol, céu azul, limpo e temperatura agradável, 11 horas da manhã. Aos poucos a Praça da Liberdade é tomada pela cor laranja que chega de todos os lados. Do Céu Azul vem a Comunidade Dandara na luta por moradia. Também lutando por moradia chega a Comunidade Eliana Silva do Barreiro e a Comunidade Dona Helena Grego da Região Norte. Da Região Nordeste chegam os defensores da Mata do Planalto. E vem mais gente da Região Norte, é o pessoal do Bairro Mantiqueira lutando por moradia, postos de saúde e escolas prometidas e não construídas. Da Pampulha chegam as associações de moradores que lutam contra a verticalização do entorno da Lagoa. Da Região Leste chega o pessoal dos blocos de rua, que lutaram para um carnaval livre de burocracias da PBH. E não para de chegar mais gente vestido de Laranja. Da Noroeste chega o pessoal do Coqueiros e Nacional com foto do “buraco do Lacerda” uma grande cratera no meio da rua, problema que persistiu durante todo o mandado. É também da Noroeste que chega uma Senhora explicando que as casas da Vila São José não são de um projeto de moradias populares, mas foram construídas para realocar pessoas atingidas por obras.

O microfone passa de mão em mão, democraticamente, sem excluir ninguém. As falas vão se somando e novas denúncias vão surgindo. A tentativa de derrubada da Mata das Borboletas e a venda da Rua Musas na Região Centro-Sul, as obras mal planejadas e refeitas nas Avenidas Cristiano Machado e Antônio Carlos, a perseguição aos moradores de rua e artesãos nomandes... Um instante, um manifestante tem outra denúncia. “Estas obras nas avenidas que o prefeito usa em sua propaganda foram feitas com 80% dos recursos do Governo Federal e Estadual, é propaganda enganosa.”

Uma manifestante chega puxando pelo braço um Senhor tímido e sorridente. Ele fez uma marchinha para o movimento, deixa ele cantar para a bateria acompanhar, ela pede eufórica. Com o microfone em mãos e com todos atentos, o Senhor tenta perder a timidez e surge uma voz de trovão, que lembra os sambistas da velha guarda:
‎"Quem vem de lá, quem vem de cá
Sou eu guerreiro que quero passar
Laranja e preto, sinal de guerra
Fora Lacerda,seu governo é uma merda!"

Já passa das 13 horas e a multidão não para de crescer é hora de começar o desfile. O Abre Alas fica por conta das Guerreiras de Laranja e Preto, que com espada de brinquedo e capa Laranja vão abrindo a Manifestação com a grande faixa: Fora Lacerda. Segue a Ala das Ocupações, dos Movimentos Sociais, dos Sindicatos, do Copac e por fim a Ala das Bicicletas.

Um Alemão, Doutor em Manifestações Políticas, está parado atônito na esquina de João Pinheiro com Gonçalves Dias. Ele tenta entender o que se passa. Pega um dos organizadores, identificados por uma fita amarrada no braço, se apresenta e pergunta: as manifestações políticas aqui são sempre assim? Não, este é um movimento novo, tem pouco mais de um ano. Na Europa as manifestações são mais sérias, mais aguerridas, com falas fortes! É, por aqui também já foi assim, aliás, ainda é assim em outros movimentos, mas é que fazemos política com alegria, com entusiasmo, bom humor e vibração. Nosso jeito de protestar é rindo, ridicularizando quem faz política apenas pelo poder ou pelo dinheiro. Ridicularizando empresários e políticos que precisam corromper e ser corrompidos para ganhar a vida. Eu nunca vi isso em nenhum outro lugar do mundo, pode me dar o seu contato e do movimento para conversarmos mais?

E a marcha toma a avenida João Pinheiro, chega na Afonso Pena e parece crescer a cada instante. Não é uma onda Laranja, é um mar de gente. Na porta da prefeitura um momento de descanso e atenção, todos se assentam no chão. Os Movimentos de luta por moradia dão seu recado e o pessoal do Sindieletro lê um manifesto com diversos motivos para não se votar em Lacerda. É o momento para que mais gente entenda os desdobramentos da luta, entender que gritar Fora Lacerda não é apenas combater um sujeito, mas toda uma política baseada no mercantilismo da cidade, da negociata e acordos espúrios. Os manifestantes aplaudem a cada tópico lido.

A passeata segue para a Praça Sete, onde se forma uma grande ciranda, a música já é conhecida. “Oh Dandara oh Dandara oh, a nossa luta aqui vale mais que ouro em pó, oh Eliana, oh Eliana oh, a nossa luta aqui vale mais que ouro em pó, oh Dona Helena, oh Dona Helena ho, a nossa luta aqui vale mais que ouro em pó. Mais falas e outras denúncias sobre o Prefeito Mentiroso.

A Marcha desce Afonso Pena e toma a rua dos Caetés, um funk é cantando a plenos pulmões: mente, mente, ele pisca quando mente, mente, mente, ele pisca quando mente. Mais a frente à rua deságua na praia e a música muda: praia, praia, pra pra praia da estação, praia da estação. Deita no cimento, deita no cimento.

Já na Praça, depois de 5 horas de mobilização, os Laranjas vão se acomodando enquanto no carro de som novas falas vão explicando porque é importante participar do movimento. São vários os movimentos sociais irmãos que se juntam na luta: Anel, Ames, Comando Nacional de Greve dos Estudantes, Movimento dos Servidores Públicos e não Privatizados, Cspcomlutas, Luta Anti-manicomial, Cellos, Movimento dos Ciclistas, Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura, Copac, representantes dos Feirantes e da Feira Hippie, e as Brigadas Populares.

A “festa” se estendeu até as 20 horas com os manifestantes se confraternizando e comemorando a grande mobilização. Segundo a PM foram 5.000 pessoas nas ruas, alguns menos otimistas disseram 3.500. Os números ou a exatidão desses, pouco importa, o mais importante é o que nenhum meio de comunicação de massa do nosso Estado teve a coragem de noticiar: nenhuma candidatura à prefeitura de BH conseguiu reunir tantos manifestantes, tantos militantes sem precisar pagar um centavo, pelo contrário, durante a manifestação eram recolhidas doações para pagar faixas, bandeiras, adesivos e outros materiais.

Um dia, quando velhos estivermos poderemos dizer aos nossos netos: sabe, é possível ir além. Junte seus amigos numa praça pública, faça novos amigos, converse, discuta, brinque, deboche dos poderosos corruptos, aproxime, distancie, estude, compreenda, mobilize, nada deve parecer impossível de mudar. É um prazer inexplicável juntar uma multidão para gritar junto! Obrigado BH! Vivemos e vivenciamos um momento extraordinário.

Um comentário:

Gláucia disse...

Eu senti essa energia nova. Estamos lutando contra um sistema corrupto, ilusionário, mentiroso, perverso.
Que usa de armas da dissimulação, alienação, lavagem cerebral, engodo, distração, hipocrisia...
Senti a força emanente de cada pessoa, independente, de credo, partido político, guetos, condição social, condição intelectual. Um sonoro não, à tudo que oprime o ser humano, em sua plenitude de direitos.
Senti a inovação de uma manisfestação a um governante que se recusa a ouvir a população, a qual governa.
Todos irmanados a uma mesma causa, politica, social, humanitária, ambiental.
Me emocionou a alegria, a irreverencia,a criatividade, jeito novo de guerrear.
Somos todos guerreiros pacíficos, lutamos por um mundo melhor, um mundo igualitário, bom de se viver.
Foi um fato histórico,que trará mudanças, no comportamento dos cidadãos, cansados dos desmandos, da escravidão, da exploração, da enganação nua e crua.
Fizemos história.
Essa trem não para mais...
Mineiro tem identidade com trem, não é...?
Trem é democrático, econômico.
Carrega muitos vagões, num só esforço conjunto.
Gasta menos combustível, carrega mais gente...
Que gente maravilhosa esta das Minas Gerais, essa do Belo Horizonte...