Acredito no estado eterno de mudanças.

Gosto de ver as mudanças da vida. Ontem criança, hoje adulto, amanhã idoso. Este espaço é para provocar diálogos que possam ajudar a mudar o meu jeito de olhar. E quem sabe você também entra nessa? Seja bem vindo, comente, critique, o anonimato aqui é bem vindo.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012


As mentiras e as pernas curtas do PulsarBH.

Outro dia me deparei com um site contratado para fazer campanha para o Senhor Marcio Lacerda, o Pulsar BH! A sessão Lendas Urbanas, onde dizem desmentir as mentiras que os “loucos da internet” propagam sobre Marcio, me chamou atenção.

Fiquei perplexo! Que o Marcio mente, já sabia, agora que paga para mentir é novidade. Escolhi três matérias para mostrar as pernas curtas e coloco sites para a confirmação de veracidade. E o mais louco de tudo isso é que qualquer um que acompanhe o mínimo da cidade percebe as mentiras, ou seja, a página é produzida para pegar jovens alienados e despreparados politicamente. Uma estratégia maquiavélica sórdida e mau caráter.

Aproveito para convidar a Babi Profeta, o Evandro Emeci, o Jef Cesar Campos Baetens e a Stella Swerts para debatermos o assunto!

Acho importante vocês conhecerem melhor o que dizem. As eleições vão passar, continuaremos na mesma cidade e ficar com fama de mentiroso ou vendido não é legal.


A mentira:

A perna curta:

Um hotel com 45 metros de altura interfere na imagem de todo o complexo arquitetônico, ao contrário do que afirma o vídeo. No vídeo há inclusive a fala do Senhor Marcelo Faulhaber, carioca do PSB, que veio ser Secretário de desenvolvimento de BH e presidente do COMPUR, órgão responsável por ignorar as recomendações do IGAM e IEPHA sobre os impactos da construção.
Relatório do IGAM revela que o lençol freático fica há 7 metros e o hotel tem 3 andares subterrâneos, 9 metros, pra baixo da terra. E também não contam que o projeto o hotel já prevê a sua transformação em residencial depois de 10 anos. E para completar, o plano de limpeza da pampulha é o mesmo de 2008 e não é eficiente porque não prevê a coleta do esgoto jogado diretamente na lagoa.
Água do lençol freático sendo bombeada no lote do hotel: http://www.youtube.com/watch?v=3JQECqZhj4g
Provas da fraude para a liberação da obra: http://fora_wp.falasocial.com/?p=6188


A mentira:

A perna curta:

O que eles não dizem é que os 75 mil apartamentos construídos serão para a especulação imobiliária e que apenas 12% será para moradias populares, com previsão para a construção em 20 anos. E mais, com tantos equipamentos públicos não tem espaço para a construção sem a derrubada da mata e entupimento das nascentes. E que o Quilombo Mangueiras que lá resiste será impactado e sitiado, sendo reduzido a uma pequena área. E também não falam da previsão de obras para o trânsito, coleta de esgoto e outros serviços.




A perna curta:

A pesquisa que a matéria fez não tem a menor precisão de dados. Primeiro, a praça foi reformada em 2007 e não 2008. O Decreto proibitivo é de 29 de dezembro de 2009, ou seja, dois anos após a reforma. Este decreto proibia “eventos de qualquer natureza” na praça. Foi uma exigência da Senhora Ângela Gutierrez porque as atividades religiosas realizadas na praça atrapalhavam o funcionamento do museu, segundo ela.
Assim surgiu a Praia da Estação, movimento que contestava o decreto arbitrário. Foram dias de sol e muita luta, com PM, Guarda Municipal e até o Choque. Temos imagens, vídeos e documentos que comprovam e podem ser consultados aqui:
Durante o ano de 2010, este foi o principal movimento de enfrentamento a Lacerda, segundo pesquisa contratada pela própria PBH.
Ainda em 2010, o decreto foi mudado, não baseado no estudo da tal comissão, estudo este nunca realizado, mas na ideia do prefeito de cobrar pelo uso.
Ah e o estudo não foi realizado porque a PM, os Bombeiros, a BHTrans e outros órgãos oficiais já haviam feito o mesmo estudo em 2006, antes da reforma da praça, quando identificaram ali o lugar ideal para receber grandes eventos no centro com menor impacto na mobilidade urbana.
Com o novo decreto a praça precisa ser cercada e alugada para a realização de eventos, atitudes que impedem ou dificultam o trabalho de pequenas produtoras e artistas iniciantes.
Aqui tem todo o histórico do movimento e na coluna da direita os decretos de utilização da praça: http://pracalivrebh.wordpress.com/

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Um mar de Laranjas invade BH!

“A revolução não vai passar na tv, é verdade
Sou a favor da melô do camelô, ambulante
Mas 100% antianúncio alienante
Corro e lanço um vírus no ar
Sua propaganda não vai me enganar...”  
Para ler escutando:



Manhã de sol, céu azul, limpo e temperatura agradável, 11 horas da manhã. Aos poucos a Praça da Liberdade é tomada pela cor laranja que chega de todos os lados. Do Céu Azul vem a Comunidade Dandara na luta por moradia. Também lutando por moradia chega a Comunidade Eliana Silva do Barreiro e a Comunidade Dona Helena Grego da Região Norte. Da Região Nordeste chegam os defensores da Mata do Planalto. E vem mais gente da Região Norte, é o pessoal do Bairro Mantiqueira lutando por moradia, postos de saúde e escolas prometidas e não construídas. Da Pampulha chegam as associações de moradores que lutam contra a verticalização do entorno da Lagoa. Da Região Leste chega o pessoal dos blocos de rua, que lutaram para um carnaval livre de burocracias da PBH. E não para de chegar mais gente vestido de Laranja. Da Noroeste chega o pessoal do Coqueiros e Nacional com foto do “buraco do Lacerda” uma grande cratera no meio da rua, problema que persistiu durante todo o mandado. É também da Noroeste que chega uma Senhora explicando que as casas da Vila São José não são de um projeto de moradias populares, mas foram construídas para realocar pessoas atingidas por obras.

O microfone passa de mão em mão, democraticamente, sem excluir ninguém. As falas vão se somando e novas denúncias vão surgindo. A tentativa de derrubada da Mata das Borboletas e a venda da Rua Musas na Região Centro-Sul, as obras mal planejadas e refeitas nas Avenidas Cristiano Machado e Antônio Carlos, a perseguição aos moradores de rua e artesãos nomandes... Um instante, um manifestante tem outra denúncia. “Estas obras nas avenidas que o prefeito usa em sua propaganda foram feitas com 80% dos recursos do Governo Federal e Estadual, é propaganda enganosa.”

Uma manifestante chega puxando pelo braço um Senhor tímido e sorridente. Ele fez uma marchinha para o movimento, deixa ele cantar para a bateria acompanhar, ela pede eufórica. Com o microfone em mãos e com todos atentos, o Senhor tenta perder a timidez e surge uma voz de trovão, que lembra os sambistas da velha guarda:
‎"Quem vem de lá, quem vem de cá
Sou eu guerreiro que quero passar
Laranja e preto, sinal de guerra
Fora Lacerda,seu governo é uma merda!"

Já passa das 13 horas e a multidão não para de crescer é hora de começar o desfile. O Abre Alas fica por conta das Guerreiras de Laranja e Preto, que com espada de brinquedo e capa Laranja vão abrindo a Manifestação com a grande faixa: Fora Lacerda. Segue a Ala das Ocupações, dos Movimentos Sociais, dos Sindicatos, do Copac e por fim a Ala das Bicicletas.

Um Alemão, Doutor em Manifestações Políticas, está parado atônito na esquina de João Pinheiro com Gonçalves Dias. Ele tenta entender o que se passa. Pega um dos organizadores, identificados por uma fita amarrada no braço, se apresenta e pergunta: as manifestações políticas aqui são sempre assim? Não, este é um movimento novo, tem pouco mais de um ano. Na Europa as manifestações são mais sérias, mais aguerridas, com falas fortes! É, por aqui também já foi assim, aliás, ainda é assim em outros movimentos, mas é que fazemos política com alegria, com entusiasmo, bom humor e vibração. Nosso jeito de protestar é rindo, ridicularizando quem faz política apenas pelo poder ou pelo dinheiro. Ridicularizando empresários e políticos que precisam corromper e ser corrompidos para ganhar a vida. Eu nunca vi isso em nenhum outro lugar do mundo, pode me dar o seu contato e do movimento para conversarmos mais?

E a marcha toma a avenida João Pinheiro, chega na Afonso Pena e parece crescer a cada instante. Não é uma onda Laranja, é um mar de gente. Na porta da prefeitura um momento de descanso e atenção, todos se assentam no chão. Os Movimentos de luta por moradia dão seu recado e o pessoal do Sindieletro lê um manifesto com diversos motivos para não se votar em Lacerda. É o momento para que mais gente entenda os desdobramentos da luta, entender que gritar Fora Lacerda não é apenas combater um sujeito, mas toda uma política baseada no mercantilismo da cidade, da negociata e acordos espúrios. Os manifestantes aplaudem a cada tópico lido.

A passeata segue para a Praça Sete, onde se forma uma grande ciranda, a música já é conhecida. “Oh Dandara oh Dandara oh, a nossa luta aqui vale mais que ouro em pó, oh Eliana, oh Eliana oh, a nossa luta aqui vale mais que ouro em pó, oh Dona Helena, oh Dona Helena ho, a nossa luta aqui vale mais que ouro em pó. Mais falas e outras denúncias sobre o Prefeito Mentiroso.

A Marcha desce Afonso Pena e toma a rua dos Caetés, um funk é cantando a plenos pulmões: mente, mente, ele pisca quando mente, mente, mente, ele pisca quando mente. Mais a frente à rua deságua na praia e a música muda: praia, praia, pra pra praia da estação, praia da estação. Deita no cimento, deita no cimento.

Já na Praça, depois de 5 horas de mobilização, os Laranjas vão se acomodando enquanto no carro de som novas falas vão explicando porque é importante participar do movimento. São vários os movimentos sociais irmãos que se juntam na luta: Anel, Ames, Comando Nacional de Greve dos Estudantes, Movimento dos Servidores Públicos e não Privatizados, Cspcomlutas, Luta Anti-manicomial, Cellos, Movimento dos Ciclistas, Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura, Copac, representantes dos Feirantes e da Feira Hippie, e as Brigadas Populares.

A “festa” se estendeu até as 20 horas com os manifestantes se confraternizando e comemorando a grande mobilização. Segundo a PM foram 5.000 pessoas nas ruas, alguns menos otimistas disseram 3.500. Os números ou a exatidão desses, pouco importa, o mais importante é o que nenhum meio de comunicação de massa do nosso Estado teve a coragem de noticiar: nenhuma candidatura à prefeitura de BH conseguiu reunir tantos manifestantes, tantos militantes sem precisar pagar um centavo, pelo contrário, durante a manifestação eram recolhidas doações para pagar faixas, bandeiras, adesivos e outros materiais.

Um dia, quando velhos estivermos poderemos dizer aos nossos netos: sabe, é possível ir além. Junte seus amigos numa praça pública, faça novos amigos, converse, discuta, brinque, deboche dos poderosos corruptos, aproxime, distancie, estude, compreenda, mobilize, nada deve parecer impossível de mudar. É um prazer inexplicável juntar uma multidão para gritar junto! Obrigado BH! Vivemos e vivenciamos um momento extraordinário.

sábado, 7 de julho de 2012

A cena está pronta, mas os personagens...


A montagem das chapas para concorrer à prefeitura de Belo Horizonte virou uma verdadeira barganha. Partidos mudam de lado, candidatos se apresentam e depois se retiram, alianças são formadas em absoluto desrespeito aos filiados aos partidos. Os lideres partidários em reuniões secretas decidem o futuro da cidade, alheios a quaisquer demandas da sociedade, atentos exclusivamente as barganhas eleitoreiras.

Bem, é este o cenário que assistimos na grande mídia, mas há outro cenário. Os partidos de esquerda realizaram reuniões, convenções, articulações com movimentos sociais, sindicatos e lançaram seus candidatos. Nestes partidos quem decide quem será o candidato são os filiados, nas convenções e depois de muitas discussões. Como deveria ser em todos os partidos.

Mas a diferença não termina apenas na escolha dos candidatos, a diferença é muito maior. Estes partidos, PSOL, PCB, PSTU e PCO não recebem financiamento de empresas para as suas campanhas. Para conseguir dinheiro fazem diversas ações, desde venda de camisas, botons, adesivos e outros materiais, até festas. Além disso, contam com a contribuição de cidadãos que acreditam que há uma solução para o quadro nefasto que os figurões tentam construir para a nossa capital.

As diferenças não terminam por aqui e para relacioná-las teria que escrever um livro. Mas o ponto que quero chegar é o seguinte: existe uma saída para a nossa decadente democracia. Existe uma maneira de se mudar este cenário e estamos caminhando para ela.

Cidadãos conscientes do momento político que vivemos, oriundos de todas as classes sociais e de diferentes movimentos; sindicatos, associações de bairro, coletivos, movimentos sociais, estudantis e outros, estão se engajando na luta por uma cidade realmente democrática e humana. Arrisco a dizer que BH nunca viu tanta gente interessada e aguerrida na campanha eleitoral!

E é nesta que estamos! Acompanhamos nos últimos doze meses todas as movimentações partidárias em Belo Horizonte. Conhecemos partidos, lideranças, idéias, propostas, posturas e vamos acompanhar os passos de todos os candidatos, vamos apresentar as incoerências, os oportunismos e as boas idéias.

E para quem procura um candidato, algumas dicas:
- Desvie de todos estes que trabalham com campanha financiada por grandes empresas, são eternos reféns de corruptores.
- Evite todos estes que fazem jogo de gabinete, desrespeitando seus filiados.
- E não julgue os partidos pequenos antes de conhecê-los melhor. Você vai se surpreender com ativistas engajados e uma postura diferente.

Os personagens que mais aparecem na TV não são os principais, são apenas os atores mais bem pagos. O personagem principal é você! Entre em cena!

quarta-feira, 27 de junho de 2012

É proibido criticar, é obrigado propor.


Participando de alguns movimentos pela cidade me deparo sempre com uma questão quando começamos a levantar os problemas: “Não podemos apenas criticar, temos que propor algo.” “A crítica pela crítica cai no vazio, temos que ser propositivos.” Estas frases e outras do tipo parecem como um consenso em diversos movimentos e comecei a pensar. Aliás, este texto aqui é pra pensar, não é uma conclusão.

Imagine que você é um cidadão que trabalha na construção civil, mora no Tony e trabalha no Belvedere. Por dia você gasta em torno de 2 horas para ir e outras 2 horas para voltar do trabalho. Você percebe que há algo errado nisso, há oito anos atrás você fazia o mesmo percurso em 1 hora, porque dobrou? Também há oito anos o preço da passagem era 1,65, agora é 2,65. Inconformado com a situação você reclama e ao seu lado o amigo retruca: “cara você só sabe reclamar!” Ou ainda, quando você tece um comentário do tipo: “essas obras da prefeitura não vão resolver nada e ainda atrapalham a nossa vida.” A resposta vem pronta: “uai, agora você é engenheiro? Já sabe que não vai resolver?” Ou ainda: “falou espertão, agora ensina aos engenheiros a fazer melhor.”

Nas redes sociais não é diferente, basta apresentar uma crítica que já vem alguém apontando: “este pessoal da esquerda só sabe criticar, fazer algo que é bom nada!” Ou ainda: “falar é fácil quero ver ir lá e fazer diferente.” Ou como prefere o nosso excelentíssimo Prefeito: “quem não está satisfeito que se candidate nas próximas eleições.” E a maioria nem para pra pensar um pouco nas críticas, quer mesmo é soluções, parece uma reação fruto da ansiedade generalizada que ronda o mundo: não quero saber dos problemas ou, já sei os problemas, quero ver as soluções.

Pois de tanto me apontarem assim acabei aprendendo sobre mobilidade urbana, gentrificação, privatização do espaço público, gestão de saúde e educação, parcerias público privadas, programas sociais assistencialistas e estruturantes, funcionalismo público, gestão da cultura, UMEI, APA, REIV, EIV, COMPUR, SUS, OP, UPA, BRT, PBH e um outro tanto de termos e siglas.

Só que há um detalhe, a complexidade de tudo isso impede um conhecimento mais profundo, é exatamente por isso que existem especialistas em cada área. Não é possível saber tudo sobre tudo. Óbvio. Mas e aquele cidadão que não sabe nada sobre nada, que só sente na pele, como ele pode criticar sem saber apontar soluções? Pela teoria de uma parte da população ele simplesmente não pode criticar, tem que agüentar calado.

Pensando sobre esta situação mudei de postura. Agora minhas críticas serão apenas críticas e me abstenho de propor algo. Sou um simples cidadão que sente a cidade na pele e não tenho conhecimento técnico suficiente para dizer como dever ser gerido o transporte público, mais sei que da forma como está não está certo. Também não entendo de engenharia, mas percebo que asfaltar uma via e 6 meses depois retirar todo o asfalto para colocar concreto é falta de planejamento e desperdício de dinheiro público. Não sei como gerir e manter uma escola ou um posto de saúde, mas sei que garantir 30% para as empresas terceirizadas que irão fazer esta tarefa não garante a qualidade do serviço prestado à população. Também sei que uma empreiteira começar a construir um hospital e depois abandonar a obra decretando falência, não é legal. Pior ainda quando se sabe que a mesma empreiteira foi uma das financiadoras da campanha do prefeito.

Eu não sei de nada, desconfio de muita coisa e não abro mão do meu direito de reclamar, de protestar, de apontar. Quem sabe estes apontamentos não ajudam os técnicos e especialistas a verem onde está o erro? 

terça-feira, 29 de maio de 2012

Obrigado Vadias!

Volta e meia uma sensação toma conta de mim e me faz pensar: só daqui uns 20 anos entenderemos o que é isso, o tamanho disso e o que vai virar. É Praia, é Fora, é Ocupe BH, é Ocupe a Câmara, é Sarau Vira Lata, é Copac, é Câmara Transparente, é Nossa BH, é Levante da Juventude, é Dandara, Camilo Torres, Irmã Doroty e Eliana Silva, é Quem Luta Educa, são Movimentos Sociais, Políticos e Culturais que estão transformando esta cidade de uma maneira nunca vista. BH está se remoçando com idéias e atitudes. 

Realizada em diversas cidades do mundo, a Slud Walk ou Marcha das Vadias, surgiu no Canadá, depois que um policial, em palestra sobre violência contra a mulher, afirmou que são elas quem provocam a ação pois usam roupas insinuantes e que por isso são também responsáveis pelos estupros. Coitado, não sabia o que falava e nem imaginava o que esta fala causaria.

 Há muitos quilômetros de distância do Canadá, ali na Praça Rio Branco ou Praça da Rodoviária, no sábado a tarde um grupo de mulheres se reuniu para responder a este sujeito e muitos outros com quem convivem diariamente. Mulheres de todas as idades, cores e formas lutando contra todos os tipos de opressão e por respeito. Se no passado a luta foi por direitos, hoje elas vão além, exigem respeito. Respeito ao corpo, ao modo de se vestir, respeito a liberdade de ser mulher. Chega de opressão!

E nada mais poderia causar tanto espanto a tradicional família mineira que uma mulher de peitos de fora pela rua. Se fosse no carnaval ou num programa de TV, tudo bem. Mas na rua é inconcebível! Como se espantaram, como se assustaram! Corpos coloridos e com frases fortes. Marcados pela opressão, pela ditadura da estética, pelo machismo, pela falta de respeito. Os conservadores não alcançam, não entendem e criticam com o discurso vazio: liberdade tem limites!

Coitados, não se lembram que a tradição mineira é patriarcal, conservadora e opressora, e que por isso gera, de tempos em tempos, movimentos de contestação. Nossas lutas são locais e mundiais, e lutar pelo respeito às mulheres faz muito sentido por aqui. É preciso ter coragem, ter muita convicção e força para tirar a roupa em público. Não é fácil encarar olhares de desprezo e cobiça burra. Não é fácil encarar uma família tradicional, um patrão conservador ou um colega preconceituoso. Não é fácil lutar por questões que outros acreditam não fazerem sentido. Não é fácil trazer para o seio das montanhas o desejo da liberdade tão sonhada.

 Participei da Marcha das Vadias com uma fantasia: Coronel Antônio, representante da tradicional família, da moral e dos bons costumes. Vestido com um terno, um chapéu típico dos coronéis, bengala e um ferro de passar roupa, como símbolo do direito ao trabalho, doméstico. O terno foi decorado com várias frases machistas. As brincadeiras que surgiram no meio da marcha foram engraçadas e revelam o lado perverso do machismo: não é sério, é só de brincadeira. Mas aquela brincadeira ocorre seriamente no cotidiano de muitas mulheres e não podemos deixar que seja fato corriqueiro.

Ao final, na Praça da Liberdade, as frases foram arrancadas do terno e depois de despido escreveram com batom e tintas algumas frases em meu corpo. Em seguida era para eu falar algo interessante, algo que ilustrasse o meu apoio a luta das mulheres. Mas não consegui, a emoção impediu, só conseguia pensar em minhas antepassadas, Mãe, Avós e Tias, que já sofreram muito com preconceitos e discriminações simplesmente por serem mulheres.

 A minha voz embargou, por isso precisei escrever este texto. A Todas vocês mulheres de coragem, que se manifestaram neste sábado, o meu muito obrigado! Obrigado por terem compartilhado comigo momento tão importante e forte. Obrigado por terem me acolhido e brincado comigo. A questão é muito séria e a luta é longa.

Acredito que as próximas gerações, nossas filhas e filhos, poderão encontrar um mundo melhor, uma cidade melhor, porque vocês atuaram com coragem e determinação! Obrigado por ajudarem a mudar esta sociedade. E quando algum machão vier lhes censurar, lembrem-se: ele é passado, vocês são o futuro!

Quando uma mulher avança! Nenhum homem retrocede!

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

A cidade, o carnaval e o gueto.

Nas grandes cidades Brasileiras as classes média e alta estão aprendendo a viver em guetos. E isso não é de hoje, já faz mais de trinta anos que estão neste processo. Aqui em Belo Horizonte esta realidade é facilmente percebida na ausência desses cidadãos no espaço público. Gradativamente e sem perceber perderam o direito ao espaço público e não desconfiam que foram roubados de um direito básico. Pulam de gueto em gueto, do colégio ou trabalho para o condomínio, do condomínio para o shopping e do shopping para o clube.

A população pobre cada dia é encurralada no gueto do seu bairro, onde sair à noite é perigoso, ficar na rua é sinônimo de vadiagem e para a polícia, motivo de abordagens agressivas. No centro os moradores de rua, são constantemente roubados pelo famigerado “caminhão branco” da Prefeitura Municipal que leva os seus pertences para inviabilizar a vida nas ruas. Artesãos Nômades tem seus materiais de trabalho apreendidos em ações baseadas em um Código de Postura Municipal que fere direitos Constitucionais.

Para a Administração Municipal gente na rua é sinônimo de problema ou de lucro. Se for um pequeno grupo, espontâneo ou organizado, que se reúne em algum espaço público, logo é motivo de marginalização e acompanhamento de perto pela Fiscalização Municipal. Se for um grande evento, com patrocinadores e visibilidade na mídia, a coisa muda e passa a ser reverenciado pela Administração Municipal. A ideia é clara, gente na rua tem que render lucro, ou é sinal de problema.

Gradativamente toda a população vai perdendo o seu direito de ir e vir, de curtir a cidade, de se encontrar na esquina ou na praça do bairro, de conversar, de brincar na rua. Para isso há uma justificativa perfeita: a violência. A violência está em todos os lugares, principalmente nas ruas, sendo assim, melhor que não tenha nenhum cidadão nas ruas. Caso haja, deve ser abordado, identificado e de preferência orientado a ir para a casa. Ainda não perceberam que gente na rua é sinal de segurança, um cuida do outro, e quando tem gente vendo fica mais difícil para a violência acontecer. Aliás, é seguindo esta lógica que se instalam câmeras nas ruas, saem às pessoas e entram as câmeras.

Esquecem os administradores municipais que é da natureza do homem se levantar quando é tolhido de seus direitos. Estamos de pé! Prontos para reivindicar o que é um direito nosso. Queremos as ruas de volta. Queremos o direito de poder nos encontrar em nossas praças abandonadas. Queremos o direito de desligar a televisão e ir jogar bola na hora da novela. Queremos poder tocar violão na praça e encontrar os amigos sem precisar ir para um espaço privado.

Blocos de carnaval independentes, que não têm patrocinadores ou políticos em suas organizações, são considerados um problema. Grandes blocos com patrocinadores ou políticos organizando tem, além de financiamento, toda a publicidade da Prefeitura a disposição. Esta diferença mostra o quanto a administração municipal se encontra distante da população.

Não queremos grandes blocos, não queremos cercas, nem regras absurdas para sair às ruas. Queremos de volta a nossa liberdade, o nosso direito de folia sem repressão e sem criminalização. O povo nas ruas é sinal de festa, de alegria e de revolução. Se não entendem que não queremos viver em guetos, que cercas, alarmes e câmeras são apenas motivos de opressão e não resolvem o problema da violência, demonstraremos nas ruas.

Nossa alegria é contagiante, nossa disposição é de quem tem samba no pé e fogo no corpo. Não, Sr. Prefeito, não aceitamos a sua cooptação de nossa festa. O Carnaval de Rua é do povo e não da Belotur. Suas estratégias de controle e opressão nos mostra que estamos no caminho certo. Queremos nossas ruas cheias de gente, brincando, se divertindo e celebrando a vida. Porque sabemos que só no encontro das ruas, só quando estamos diante do outro, do diferente, é que podemos crescer e aprender a ser cidadão. No gueto, Sr. Prefeito, aprende-se o medo, a angustia e a depressão, tão comuns neste povo que está sendo enjaulado em casas, escolas, shoppings e condomínios fechados.

Abram alas, o Carnaval de Rua vai tomar a cidade, vai contaminar a sua alma e quando estiver desanimado, solte corpo, entre na dança, porque quem fica parado vai acabar aprisionado.

Em tempo: A lei geral da FIFA, que também será aplicada em nossa capital, prevê que para as festas de rua só poderemos nos encontrar nas Fan Fest, espaços cercados e com segurança particular. Já foram montadas arenas desse tipo na Praça da Estação e na Praça JK. Um teste para a Copa, onde todos os bares deverão ser fechados em dias de jogos e só poderemos nos reunir nestes espaços cercados.